22 abril 2008

Viver 2008

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No início de 2007, enviei uma mensagem pedindo dias mais leves e luminosos. Ao longo de um ano, esses dias vieram um atrás do outro, com um certo espaçamento entre eles, mas sim vieram. Não foram abundantes. Foram suficientes. Não seguiram uma seqüência banal, gratuita, nem complexa ou indecifrável. Foram naturais. Ritmados em seu tempo – não o cronológico, mas o vivenciado. Dias para serem experimentados, sem grandes enigmas, códigos ou metáforas. Dias claros. Dias casuais, marcados no calendário por necessidade, ou mero acaso. Dias expressivos. Sim, esses dias existiram porque eu os permiti.
No ano que se passou, medos engasgados foram vomitados. E abriu-se espaço para novas fragilidades. Novos ou antigos, os temores autênticos aprendemos a combatê-los com espadas, verbos e silêncio.
Lições para o fim de nossas vidas, para outras e tantas outras vidas.
Definitivamente, 2007 não foi um ano de finalizações. Assuntos não foram esgotados. Não foi um ano sabático, muito menos de rotina de trabalho convencional. Foi um tempo de experimentação, teve um quê laboratorial. Nada de grandes desafios nem de marasmos perpétuos.
Talvez um ano de iniciações: enfim percebi o quanto sou “nada”. Sou ninguém. Ao compreender O Espelho de Guimarães Rosa – grande tudo – eu toquei no vazio, no puro, no ser-eu. Confesso que fiquei mais do que apavorada. E o que eu faço com essa descoberta?

Em 2007, a casa foi reformada. A parede áspera na sala não existe mais.
Enquadrei fotos, desenhos, postais, croquis, caricaturas.
Um amigo se foi em um acidente de carro – no dia do meu aniversário.
Os quatro anos foram festejados na fazendinha.
Montei um, dois, três aquários.
Minha mãe e eu tentamos traduzir Clarice Lispector para o japonês. Desistimos.
Anjos vieram para nos acompanhar. Alguns podemos ver, outros não.
Abracei minha irmã em seu casamento.
Segurei mais do que crianças em meus braços.
(do meu jeito) disse ao meu pai que o amava.
Senti superação ao ver meu filho cruzando uma linha de chegada.
Hamsa Hand será minha próxima tattoo. “Toki” será a próxima da próxima.
Imaginei adotar uma criança. Egocentrismo, altruísmo, modismo – é apenas uma idéia.
Ouvir minha mãe cantar lindamente deixou-me comovida.
Li mais do que escrevi. O pouco que escrevi, foi muito.
Sustentei para ser sustentada e vice-e-versa.
Em 2007, Oroborus esteve presente mais do que nunca.


Há poucos dias li uma obra de Elizabeth Kübler-Ross, uma médica psicanalista estudiosa da morte, do morrer, da não-morte e por aí vai. Dizia: (...) dei-me conta que não se pode confiar no futuro. A vida é sobre o presente.
Não vivemos do que se foi e não vivemos do que virá. O que nos sobra? Um delicado intervalo de vida entre passado e futuro, que pode ser um nada. Uma merreca. Uma ninharia. Mas pode ser eterno. Pode ser Viver. E isso sim, é Tudo.
A cada virada de ano, somos visionários. Apontamos dias esperançosos em um tal de “futuro”. Pouco a pouco esses dias vêm até nós – ou somos nós que vamos até eles. Depois, é claro, de viver hoje.
Em todos os aspectos, em todas as leituras, enquanto tiver significado, desejo que em 2008 sejamos presentes. Uns com outros, mas acima de tudo, presentes para nós mesmos.

Vejo dias claros.
Digo clareza, não claridade.
Luz em excesso pode cegar.
Vejo dias claros.

Viver 2008.

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2 comentários:

f. disse...

Quilida. Adoro te ler.

nina disse...

bom saber que vc tem passado por aqui
thanks!